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Os desafios enfrentados pelo transporte ferroviário no Brasil

O transporte ferroviário no Brasil teve início em 1854, quando D. Pedro II inaugurou o primeiro trecho de uma linha ferroviária que ligava o Porto de Mauá à Fragoso, no Rio de Janeiro. Mais tarde, a infraestrutura do transporte ferroviário no país foi expandida com a ajuda de investidores estrangeiros, principalmente britânicos, visando incentivar a economia por meio da exportação de produtos agrícolas e da mineração.

Atualmente, o transporte ferroviário é responsável por cerca de 21% da movimentação de cargas no Brasil, mas a falta de investimentos em infraestrutura é um dos principais entraves para o setor ferroviário no Brasil. O país possui mais de 28 mil quilômetros de ferrovias, mas grande parte da rede está obsoleta e sem manutenção adequada, o que compromete a sua capacidade de transporte. Além disso, a falta de modernização tecnológica e a falta de investimentos em equipamentos, como locomotivas e vagões, também limitam a eficiência do transporte ferroviário.

Outro desafio enfrentado pelo transporte ferroviário no Brasil é a competição com outros modais, como o rodoviário e o aquaviário. Apesar de ser considerado um modal mais seguro e sustentável em comparação com o transporte rodoviário, o modal ferroviário ainda é pouco utilizado no país. Para reverter esse cenário, são necessários investimentos em infraestrutura e em tecnologia, além de políticas públicas que incentivem o uso do transporte ferroviário para cargas de longa distância.

Breve histórico do transporte ferroviário no Brasil

Foi em 30 de abril de 1854 que D. Pedro II inaugurou o primeiro trecho de uma linha ferroviária no Brasil, ligando o Porto de Mauá à Fragoso, no Rio de Janeiro, com apenas 14 km de extensão. Até hoje, quem cruza a rodovia BR-116 (Rio – Teresópolis) passa por um trecho onde uma placa sinaliza o cruzamento da primeira ferrovia brasileira.

transporte ferroviário no Brasil - Estrada de Ferro Mauá
Estrada de Ferro Mauá – primeira ferrovia do Brasil

Anos mais tarde, em 1872, foi criada a Estrada de Ferro Oeste de Minas, que se estendeu por a outras cidades e ramais, chegando a alcançar, em 1894, uma extensão total de 684 km, sendo considerada, então, a primeira ferrovia brasileira de pequeno porte.

No período imperial, o governo implantou um sistema de concessões, com o objetivo de atrair investidores estrangeiros. No início do século XX, os recursos estrangeiros, principalmente dos britânicos, alavancaram o desenvolvimento da infraestrutura do transporte ferroviário no Brasil.

A ideia desse plano de desenvolvimento era, principalmente, incentivar a economia através da exportação da produção agrícola e da mineração, interligando os centros produtores aos portos brasileiros.

Durante os primeiros anos do século XX iniciou-se um processo de transferência da malha ferroviária para o controle do governo brasileiro. No entanto, após a Segunda Guerra, o processo de decadência que tomou conta das lavouras de café, algodão e fumo, principais produtos do transporte ferroviário no Brasil, acabou por trazer prejuízos a muitas linhas férreas. Além disso, o desenho da malha ferroviária, já naquela época, se mostrava com pouca integração, havendo, praticamente, algumas malhas desconectadas, que se caracterizavam por sistemas individuais.

Com o agravamento da situação econômica de várias ferrovias controladas pelo governo, em 1957 o então presidente Juscelino Kubitschek assinou a lei 3.115 criando a Rede Ferroviária Federal (RFFSA), para administrar as redes ferroviárias federais, formadas, na época, por 18 empresas férreas.

Em 1992, a RFFSA foi incluída no Programa Nacional de Desestatização (PND), transferindo os serviços de transporte ferroviário de carga para o setor privado, sendo a RFFSA extinta através de Medida Provisória assinada em 2007.

Infraestrutura do transporte ferroviário no Brasil

Segundo dados mais recentes, o transporte ferroviário no Brasil é responsável pela movimentação de, aproximadamente, 21% das cargas movimentadas no país considerando os TKUs (tonelada-quilometro útil). Esse percentual demonstra a baixa participação do modal ferroviário no transporte de cargas no Brasil, quando comparado a outros países, como a Austrália (55%), Canadá (34%) e Estados Unidos (27%).

Segundo dados do Anuário da Confederação Nacional dos Transportes (2022), a infraestrutura da malha ferroviária dispõe de 13 operadoras reguladas pela ANTT (Agência Nacional de Transporte Terrestre) que juntas, somam uma extensão de 29.888 km. As duas maiores operadoras são a FCA (Ferrovia Centro Atlântica) com 7.860 km e a RMS Logística S.A. com 7.223 km.

Além dessas operadoras existem outras, de menor porte, para transporte de passageiros e de cargas, que possuem, juntas, 1.411 km. Entre elas estão a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), as companhias de metrô do RJ e SP, entre outras. A extensão total então dos principais ramais e linhas no Brasil é de 31.299 km, considerando todas as operadoras acima citadas.

Mapa Ferroviário Brasileiro (Fonte: ANTF, 2022).

Pelo mapa, podemos observar que a malha ferroviária brasileira ainda é deficiente, se considerarmos a extensão territorial do país. Além disso, a malha existente carece de melhorias, pois em muitas delas encontram-se diferentes tipos e arranjos de bitolas (distância entre trilhos) nos projetos ferroviários, dificultando a integração entre essas redes.

Toda essa estrutura foi responsável, em 2021, pelo transporte de 371,4 bilhões de TKUs. Estiveram em operação 2.972 locomotivas e 98.740 vagões em circulação. Importante ressaltar que esses veículos não foram restritos ao transporte de cargas, mas também ao de passageiros, registrando um total de 610.058 pessoas.

Em relação às cargas, destacamos como principais o transporte de minério de ferro, adubos e fertilizantes, combustíveis derivados de petróleo e açúcar. Para esse transporte são utilizados diferentes tipos de vagões, que tem como objetivo um melhor acondicionamento e proteção da carga transportada.

Os vagões fechados, por exemplo, são adequados para evitar exposição da carga aos riscos decorrentes de intempéries climáticas que possam ocorrer durante o transporte. Nesses vagões, a carga fica completamente protegida, sem contato com o ambiente externo.

Os vagões gôndola, ao contrário, são utilizados para transporte de produtos que não sofram influência do tempo. É muito utilizado, por exemplo, para o transporte de minérios, sendo semelhantes aos vagões fechados, porém sem as portas laterais e sem o teto, por onde o produto é carregado e descarregado.

Para o transporte de carga viva, o ideal é utilizar os vagões gaiola. Esses têm aberturas laterais que permitem a circulação do oxigênio necessário para que os animais não sofram ao longo do trajeto.

Produtos perecíveis, sujeitos principalmente à ação da temperatura, devem ser transportados em vagões frigoríficos, que têm um sistema de controle de temperatura capaz de mantê-la no nível adequado à conservação da integridade da carga.

Produtos líquidos, como combustíveis, devem ser transportados em vagões tanque, normalmente cilíndricos e que podem ser construídos de materiais especiais que evitem, por exemplo, danos aos vagões decorrentes do transporte de produtos corrosivos.

Um tipo específico, o vagão plataforma permite o transporte de diferentes tipos de carga, como bobinas de aço, containers, toras de madeira e outros materiais que necessitem ser transportados e que, por suas dimensões ou formatos, não sejam adaptados a outros tipos de vagões.

Há ainda os vagões hopper que se caracterizam por apresentar uma estrutura semelhante a um funil, que permite a descarga do produto pela parte inferior do vagão.

Estrutura de custos do transporte ferroviário no Brasil

O transporte ferroviário é caracterizado por apresentar um custo fixo elevado, composto pelo arrendamento das malhas ferroviárias e dos terminais, principalmente. Por outro lado, os custos variáveis são mais baixos, representados pelo custo da mão-de-obra, combustível e energia.

Assim, buscando aumentar a margem de lucro é importante diluir os custos fixos, ganhando em escala nas operações. Para isso, é necessária uma infraestrutura adequada para que seja possível, por exemplo, suportar um maior peso de carga por eixo dos vagões, dessa forma reduzindo o custo fixo unitário.

Em termos de investimentos, o total investido pelas concessionárias em 2016 foi de 3,6 bilhões de reais. Mais da metade desse valor foram investimentos em infraestrutura (33,8%) e veículos (locomotivas e vagões), que somaram 23,1%.

O frete ferroviário é calculado considerando-se alguns fatores, principalmente o peso da carga e a distância percorrida. Considera-se o peso da carga no cálculo do frete pois esse está diretamente relacionado com o desgaste dos materiais das linhas decorrentes de excesso de peso. Já a distância está relacionada com o custo do combustível ou da energia gasta no transporte da carga.

A ANTT (Agência Nacional de Transporte Terrestre) dispõe, em seu site, de simuladores tarifários para as concessionárias, que permite simular as tarifas máximas a serem cobradas para diferentes cargas, considerando, também, a distância percorrida.

Vantagens e desafios do transporte ferroviário no Brasil

A seleção do modal de transporte mais adequado ao transporte de cargas já foi discutida na publicação “Qual o modal mais adequado para transporte de sua carga?” em nosso blog.

Sem sombra de dúvidas, uma das maiores vantagens do transporte ferroviário no Brasil é a possibilidade de transportar grandes volumes de carga em longas distâncias. Isso, como comentado, reduz o custo unitário do transporte e aumenta a sua competitividade em relação a outros modais de transporte.

Além disso, é possível em um mesmo comboio de trem, transportar vários tipos de carga, bastando para isso acoplar diferentes vagões. Assim é possível otimizar a logística de transporte, com um adequado planejamento das cargas movimentadas.

Podemos ainda citar, como uma vantagem, a maior eficiência energética com menor emissão de gases de efeito estufa por tonelada transportada quando comparado, por exemplo, ao transporte rodoviário.

O transporte ferroviário também pode ser considerado um transporte seguro, na medida em que é pequena a possibilidade de roubos de carga, assim como baixa a ocorrência de acidentes durante o transporte da carga.

Um dos principais desafios do transporte ferroviário no Brasil é a falta de investimentos em infraestrutura ferroviária nas últimas décadas. A rede ferroviária brasileira é insuficiente e inadequada para atender à demanda atual de transporte de cargas, o que resulta em limitações no acesso a alguns locais. A falta de manutenção e modernização da infraestrutura existente também resulta em problemas como descarrilhamentos e atrasos.

Outro desafio é a concorrência com outros modais, principalmente o rodoviário, que domina o transporte de carga no país. A maioria das cargas no Brasil é transportada por caminhões, sendo que muitas empresas preferem o transporte rodoviário devido à sua flexibilidade e facilidade de acesso aos locais de produção e distribuição. Um outro fator está relacionado à velocidade atingida pelo transporte ferroviário. Para se ter uma ideia, em 2021, a velocidade média anual de percurso para as diferentes concessionárias variou de 11 a 54 quilômetros por hora. Essa baixa velocidade impacta diretamente os tempos nas operações logísticas e, por isso, o transporte ferroviário é evitado em cadeias onde o tempo e a velocidade de entrega são fatores críticos.

A falta de integração entre modais também é um desafio para o transporte ferroviário no Brasil. A infraestrutura ferroviária muitas vezes não se conecta com outros modais, como a navegação fluvial e marítima, limitando a eficiência do transporte de carga em áreas remotas do país. Além disso, muitas empresas não têm acesso direto a ferrovias, o que dificulta o transporte de carga por esse modal.

Para enfrentar esses desafios, é necessário investir na modernização da infraestrutura ferroviária, na melhoria da integração com outros modais e no desenvolvimento de políticas públicas e incentivos que fomentem o uso do transporte ferroviário. Somente com essas medidas será possível aproveitar o potencial do transporte ferroviário para o desenvolvimento econômico do país e para a melhoria da qualidade de vida da população.

O Governo Federal, através do Programa de Investimentos em Logística (PIL) tem buscado incentivar os investimentos no setor através das prorrogações antecipadas das concessões qualificadas pelo Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). Assim, a partir dessas prorrogações, estima-se um investimento da ordem de 30 bilhões de reais, pelas empresas, direcionados ao aumento da capacidade de transporte da malha, para a redução de conflitos urbanos e para a superação dos gargalos logísticos no transporte ferroviário no Brasil.

Referências

ANTF. Mapa Ferroviário. Acesso em 18 abr. 2023.

____. Prorrogações de contratos avançam de norte a sul. Acesso em 18 abr. 2023.

CNT. Anuário CNT do Transporte 2022.

ILOS. Matriz de transportes do Brasil à espera de investimentos. Publicado em 21 ago. 2020. Acesso em 17 abr. 2023.

IPHAN. História das ferrovias no Brasil. Acesso em 17 abr. 2023.

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